“Precisamos de alimentos”, implora prefeito de Canoas (RS)

Os temporais no Rio Grande do Sul deixaram um rastro de destruição que ainda está longe de ser resolvido. Canoas, cidade da região metropolitana de Porto Alegre com cerca de 350 mil habitantes e uma das mais castigadas pelas enchentes, está com dois terços da área urbana tomados pelas águas, e já soma mais de 180 mil pessoas desalojadas.

Com cerca de 60% da infraestrutura de saúde do município perdida, o prefeito de Canoas, Jairo Jorge (PSD), disse em entrevista ao Correio que espera a ajuda dos governos estadual e federal para reconstruir a cidade, mas aponta que a prioridade agora é garantir água potável para as mais de 20 mil pessoas que estão nos abrigos da prefeitura que também sofrem com a falta de alimentação.

Qual é a situação na cidade?

Canoas foi duramente atingida, temos dois terços do território da cidade inundados, temos 180 mil pessoas atingidas, temos 80 mil residências, empresas e comércios que foram totalmente danificados. A infraestrutura da prefeitura, unidades básicas de saúde, escolas, prédios públicos, 60% deles estão inviabilizados. Serão alguns bilhões de investimento na cidade para recuperar o nosso município. Somos a terceira população do Rio Grande do Sul e a maior arrecadação de ICMS do estado, somos um polo industrial, mas grande parte desse parque foi atingido, está em baixo da água. Isso afeta a economia de Canoas e toda a economia do Rio Grande do Sul.

Quando a água baixa?

A água baixou 40 centímetros nas últimas horas, mas há uma previsão de chuva nas próximas 48 e 72 horas, o que é um problema. De acordo com o IPH (Instituto de Pesquisas Hidrológicas) da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), a previsão é de levar uma semana para baixar um metro, como temos em média 5m, com alguns lugares chegando a 7m, você vê que é muita água. A previsão é de 45 dias.

As casas térreas, então, foram cobertas pela água?

Todas as casas térreas estão cobertas, algumas nem aparece o telhado, algumas pessoas foram para os telhados e tiveram risco de perder a vida. Eu tenho colegas aqui que foram para o telhado e ficaram com a água no peito, mesmo estando em cima dos telhados.

Falhou a prevenção nos diques?

Isso aconteceu porque o sistema de proteção que a gente tem foi elaborado para a enchente de 1941, então a cota é de 5m — o ápice foi 8 de maio daquele ano e foi de menos de 4,75m. Como a água dessa vez foi muito alta, acabou causando todo esse problema, agora o objetivo é tirar a água, e, depois, trabalhar para ampliar o nosso sistema de proteção elevando o nível dele. Isso destruiu a cidade e não podemos permitir que aconteça novamente.

Quantas pessoas estão abrigadas?

Nós temos 72 centros com 22 mil pessoas. São nesses centros que fazemos a entrega de alimento e as pessoas estão desesperadas, precisamos de ajuda, precisamos de alimentos, material de higiene, material de limpeza. Cerca de 40% dessas 22 mil pessoas estão dormindo no chão. Não temos colchões. As pessoas estão com fome, estão desesperadas, é importante que nos apoiem, acho que talvez seja a situação mais grave no Brasil, uma cidade com 350 mil habitantes e dois terços dela inundados.

E quem não está nos abrigos?

Como um terço da cidade não foi atingido, elas foram para casa de familiares, mas também temos muita gente nas ruas, dentro de carros, acampando em praças. E agora estamos em uma crise de abastecimento. O que as pessoas vão comer?

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E o abastecimento de água?

Nós temos 100% da cidade sem água, temos apenas um terço da cidade com energia elétrica, o resto está no escuro. Temos a expectativa que seja colocado um novo sistema para uma estação de tratamento e, com isso, acreditamos conseguir que 80% da área seca da cidade volte a ter água, mas isso só em 48 horas. Imagina a precariedade de abastecer milhares de pessoas apenas com caminhões pipa. Também estamos cavando poços artesianos na cidade para poder fornecer água potável.

Circularam notícias de que teriam corpos boiando na cidade, isso se confirmou?

Não, isso não se confirma, temos dois óbitos, é possível que tenhamos mais, mas eu fiz uma vistoria de barco e de helicóptero, fui a região mais atingida onde aconteceu o rompimento do dique, e não verificamos isso, não se confirmou. Estamos com muitos problemas com fake news, estamos vivendo esse drama com algumas pessoas usando de um oportunismo climático, o que têm criado muito problema. Outra notícia falsa foi que a companhia elétrica tinha religado a energia em uma região alagada, isso atrasou a entrada de equipes de resgate em duas horas.

Tem relatos de saques, alguém já foi preso?

A Brigada Militar (BM) prendeu dois bandidos que estavam fazendo esse tipo de furto, a BM está atuando, temos também a Polícia Civil, a Força Nacional chegou aqui também, há um reforço no policiamento. Aqui, como no resto do Brasil, temos a presença de facções, e elas estão fortes aqui. Tivemos de janeiro a março, 34 homicídios, metade do que tivemos no ano passado, isso em apenas três meses, temos uma verdadeira guerra entre esses grupos. Eles estão atuando, mas vamos coibir, a polícia está fazendo o patrulhamento, tanto na área seca, onde nós dobramos a população, como por barco na área inundada.

O senhor esteve com o ministro Pimenta e o presidente Lula?

Eu acredito que o governo federal vai estender a mão, nós temos aqui prejuízos de bilhões. Não serão R$ 600 milhões para resolver os problemas de Canoas nem do Rio Grande do Sul. Eu falei rapidamente com o presidente Lula e com o ministro Paulo Pimenta e tenho certeza de que eles vão interceder pelo estado. É claro que ainda estamos em uma fase muito inicial, mas eu acredito que o presidente Lula é sensível.

E a conversa com a ministra Nísia Trindade (Saúde)?

Com a ministra Nísia, falamos sobre a nossa estrutura de saúde, perdemos o nosso hospital de pronto-socorro, totalmente comprometido. Das nossas 27 unidades de saúde, perdemos 19, das 4 UPAs perdemos 3, das 5 farmácias distritais perdemos 4, perdemos os 4 CAPs da cidade, é um dano muito difícil de recuperar. Estávamos instalando um tomógrafo novinho no hospital de pronto-socorro, ia entrar em operação por agora, foi totalmente inundado. Perdemos o tomógrafo novo e o antigo que existia. O hospital vai precisar de todos os equipamentos novos. Vai exigir um grande esforço.

Foi afetada a refinaria da Petrobras que abastece o estado?

A refinaria de Canoas não foi afetada, mas o problema é que os acessos estão comprometidos. O acesso de Canoas até Porto Alegre é geralmente em 40 minutos, agora estamos levando quase três horas. Esse é o grande problema que nós estamos enfrentando com o desabastecimento.

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